Happening “Expurgo” mobiliza artistas-professores na Galeria de Arte e Pesquisa da UFES durante o XVI Seminário Capixaba sobre o Ensino de Arte

Happening “Expurgo” mobiliza artistas-professores na Galeria de Arte e Pesquisa da UFES durante o XVI Seminário Capixaba sobre o Ensino de Arte

Na noite do dia 6 de agosto de 2025, a Galeria de Arte e Pesquisa da Universidade Federal do Espírito Santo (GAP/UFES) será palco de uma potente ação coletiva que entrelaça arte, educação e resistência: o happening “Expurgo”. Integrando a programação do XVI Seminário Capixaba sobre o Ensino de Arte – Percursos Disruptivos, a ação reúne artistas-professores em práticas performáticas que invocam o gesto de “expulsar o indesejado”, limpar os resíduos simbólicos que limitam a criação e denunciar o adoecimento nas estruturas da educação e da cultura.

Com curadoria das professoras Isabela Frade, Rosana Paste e Stela Maris Sanmartin, do Departamento de Artes Visuais da UFES, o happening propõe um espaço expandido de liberdade criativa, provocação política e partilha de experiências sensíveis. Mais do que um evento artístico, “Expurgo” configura-se como uma manifestação crítica, lúdica e afetiva que desafia os limites entre arte e educação, criando um ambiente onde o público é convocado a participar ativamente da reflexão e da ação.

Um ritual coletivo de libertação

A proposta curatorial parte da ideia de expurgo como um “ato de limpar, de retirar as impurezas, de se desfazer do que bloqueia”. Como aponta a professora Stela Maris Sanmartin, o conceito envolve um gesto de liberação — uma força para expelir o que oprime e compromete a práxis criativa de docentes e artistas. Trata-se de um movimento simbólico e corporal que ativa questões urgentes sobre saúde mental, precarização do trabalho, silenciamento, censura e adoecimento nos espaços educacionais e artísticos.

“Expurgo é um happening expandido”, explica Isabela Frade. “É uma convocação para que artistas-educadores ativistas provoquem com suas ações críticas e poéticas dentro da universidade, um lugar que também sofre os efeitos de um cenário de desmonte da educação, da mercantilização da arte e do cerceamento de discursos. Em um ambiente em que o público é majoritariamente composto por educadores, a ação tem o potencial de mobilizar afetivamente e politicamente o seminário”.

Percursos disruptivos e presença encarnada

A proposta do evento ressoa diretamente com o tema do seminário — “Percursos Disruptivos” — ao valorizar a presença encarnada, vivencial e crítica dos professores-artistas como agentes de transformação. Rosana Paste destaca que “a arte pulsa, o artista revela. Expurgar é manter-se em resistência, é experienciar a experiência. É um chamado à atenção sobre o cuidado com o corpo, com a saúde física e mental de quem ensina, cria e resiste cotidianamente”.

A ação pretende atuar também como um espaço de cuidado e escuta, convocando o público para além do papel de espectador. A intenção é criar um campo de presença, encontro e compartilhamento dos afetos e das dores, das opressões e dos gritos que ainda não foram ouvidos. Expurgar é, nesse contexto, uma ação política e sensível ao mesmo tempo.

Artistas e ações

O happening reúne dez propostas performativas de artistas-professores que apresentarão trabalhos nos mais diversos formatos — da poesia concreta à performance corporal, do silêncio ritual ao gesto de denúncia. São elas:

– Fragmento-órgão – Lohany Monteiro Soares
– Caixa de Omissão – Inara Novaes
– Expurgar: poema concreto de um corpo em espasmos – Rhuan Cruz
– Fonte – Isabela Martins
– Expurgo no toque quadrado no Piano de acompanhamento – Vandaluz Junior
– Dobrar o grito – Eloiza Comério
– Jardim dos Silêncios – Amaná Cardoso de Paula
– AMArras – Andrea Giordano
– Um Instante – Jaqueline Torquato
– Se essa norma fosse minha – Sarah Damiani

Cada uma dessas ações se propõe a tensionar normas, rasgar silêncios, expor conflitos e liberar gestos que possam reconectar corpo, arte e existência.

A universidade como território de luta e criação

Ao se realizar dentro da Galeria de Arte e Pesquisa da UFES, o happening “Expurgo” resgata a vocação da universidade pública como espaço de experimentação estética, crítica e social. Em tempos de desvalorização da arte e de cerceamento das liberdades, reafirma-se o papel do artista-professor como sujeito político que transforma a dor em criação e que transforma a criação em denúncia e em cuidado.

“Expurgo” não se limita à denúncia — ele também é uma celebração da potência de resistir, de imaginar outras formas de vida e de luta. Em meio aos percursos disruptivos do ensino da arte, o happening emerge como uma ação necessária e urgente para quem acredita na arte como prática viva, como ferramenta pedagógica e como força de transformação coletiva.

SERVIÇO
Happening “Expurgo” – Ação coletiva de artistas-professores
Galeria de Arte e Pesquisa – GAP/UFES
06 de agosto de 2025 (terça-feira)
18h
Aberto ao público e participantes do XVI Seminário Capixaba sobre o Ensino de Arte

Entrevistas

Stela Maris Sanmartin

  1. A proposta de Expurgo tensiona os limites entre ação estética, ato político e experiência pedagógica…

 

Em primeiro lugar encarar o desafio nos permite tomar consciência sobre o problema, primeiro passo para encontrar maneiras de lidar com ele. Ainda, problematizar as dificuldades por meio da expressão estética leva à uma elaboração simbólica potente de transformação pessoal. A crítica  não deixa de ser um ato político, tão importante na formação e vida de todos nós.

 

2.O termo “expurgo” traz uma carga simbólica forte de ruptura e reinício…

 

Expurgar como ato de colocar para fora, retirar, eliminar significa purificar ou finalizar processos para dar início a novos projetos. Este é um princípio vital e pode ser norte para a prática pedagógica que privilegia a reflexão sobre a ação.

 

Rosana Paste

 

1.A proposta do Expurgo enfatiza o atravessamento do corpo e da experiência sensível. Como você enxerga a potência do corpo docente como corpo poético e político dentro das práticas educativas em arte.

 

Vou responder a partir de minha experiência.  Uma das pesquisas que desenvolvo é  pensar o “entre” do artista-professor que é  muito diferente de professor-artista.

Minha experiência com a arte vem antes da docência. Me considero uma boa professora porque desenvolvo minha poética cotidianamente.

Neste sentido o corpo poético da artista é  o mesmo corpo poético da professora que sente os prazeres e as angústias de seu processo de criação.

Sei o quanto meu corpo poético  é  importante na formação de nossos estudantes, sei o quanto meu corpo poético é  político na luta diária por uma educação  de qualidade e comprometida com a sociedade. Sei o quanto as práticas precisam ser educativas porque formamos professores q entram na rede de ensino. Esses professores precisam exercitar seu corpo poético cotidianamente, caso contrário adoecem. A realidade é  essa: professores trabalhando 3 horários todos os dias para pagarem suas contas, doentes sem tempo para seu corpo poético.

Enfim quanto mais desenvolvemos nossa poética mais chances temos de potencializar nossos corpos para seguirmos em resistência política, social, cultural, ambiental!

 

2.Seu trabalho articula fortemente arte e resistência. No contexto do Happening Expurgo, como você compreende o papel da arte em tempos de adoecimento coletivo, especialmente no que diz respeito à saúde emocional dos artistas-professores?

 

Quando criamos o edital foi nesse sentido de sua pergunta: formamos professores, tenho contato permanente com nossos egressos a 31 anos. Cada ano q passa as condições estão  piores. Além  dos baixos salários, nos últimos anos a violência sofrida pelos professores é  alarmante!!!

Expurgar é  literalmente uma ação de limpar a dor que esses professores estão sentindo, expurgar é  a chance de um abraço  coletivo e saber que estamos juntos nesse bonde, expurgar é criar um corpo coletivo poético para resistir….

Expurgar é  terapêutico para seguirmos, pois quem escolhe a profissão de artista-professor é porque acredita que a mudança é  pela educação e nunca vai desistir!

Isabela Frade

 

1.Em que medida o Expurgo pode ser entendido como uma ferramenta para reconfigurar o espaço universitário, não apenas como lugar de formação, mas como ambiente de mobilização e afeto?

 

O Expurgo pode atuar no sentido de chamar a atenção para a importância da vivência na arte para os docentes em formação, especialmente na área do ensino de arte.

É perceptível que, no currículo de formação dos professores, há uma predominância, especialmente nos anos mais avançados, de atividades voltadas ao estágio e aos componentes da pedagogia. O futuro professor de arte, com isso, acaba se afastando dos laboratórios, não consegue acompanhar as exposições, os estudos em história da arte e da crítica, e termina por ficar excessivamente direcionado à questão pedagógica. Essa dimensão é, sem dúvida, essencial, mas não se pode abrir mão da experiência artística.

Afirmar essas questões no seminário é também evocar as lembranças dos professores que já estão em atuação, incentivando que continuem artistas. E, ao mesmo tempo, provocar nos que ainda estão em formação a percepção da importância desse elo entre teoria e prática, entre arte e pedagogia. Enfim, dizer como fazer é diferente de vivenciar.

É um grito que revela o esquecimento da arte, inclusive dentro da universidade.

 

2.Qual a importância de provocar a escuta e o envolvimento sensível dos espectadores no Expurgo, especialmente num contexto formativo como o do seminário?

 

Essa escuta e esse envolvimento são importantes, primeiro porque se trata de um evento de arte e educação. Trazemos a experiência artística para ser pensada também como um espaço de produção de conhecimento, não apenas por meio de textos e citações de livros, nem exclusivamente pela pesquisa acadêmica (a qual, claro, é fundamental para a formação do professor), mas também através da vivência da arte como parte indissociável do ser professor-artista.

Nesse sentido, nós, como organizadoras do evento, propomos esse envolvimento das pessoas nesse ato , esse happening, como o definimos. Um acontecimento intempestivo, sem programação prévia, ou seja, um ato de impacto direto ao público presente.

Serão provocadas, pelos artistas, situações significativas de sua vivência profissional enquanto docentes ou estudantes de graduação. O Expurgo, assim, representa um ato catártico.

Quando falamos de educação, reconhecemos que há uma série de questões que são motivos constantes de angústia e reclamação por parte dos docentes. Essas demandas poderão se manifestar na ação.

É importante destacar ainda o lugar de subalternização ao qual a arte é frequentemente relegada , inclusive dentro da própria universidade, onde, em muitos casos, a disciplina é deslocada para um espaço de menor importância.